Homenagem ao Dia da Água - 22 de março

1.Introdução
“Louvado sejas meu Senhor, pela irmã Água, que é muito útil e humilde e preciosa e casta”. É comum citar ou proferir uma ou outra frase do Cântico das Criaturas, de São Francisco de Assis. Mas quando se lê parece estranho o louvor por uma criatura sem mencionar as outras. Ou também, ao contrário, quando se lê, por exemplo, o verso que fala da irmã Água, se tem presente todas as outras criaturas. Porque, tanto no Cântico de Francisco quanto na natureza, tudo está interligado, inter-relacionado e a água, como o sangue num organismo, parece ser o elemento que interliga, inter-relaciona todos os seres criados. Ela está em todas as formas de vida, é verdadeiramente fonte de vida.
Isso explica um gesto extraordinariamente profético que o Brasil e o mundo todo recentemente puderam ver. O bispo Dom Frei Luiz Cappio realizou uma greve de fome que duraram 11 dias, entre final de setembro e início de outubro de 2005, denunciado e protestando contra o projeto de transposição de parte das águas do Rio São Francisco e defendendo a sua revitalização. O jejum de Frei Luiz Cappio foi um gesto muito significativo e "teve a força de mostrar a verdade". Fez com que o povo soubesse o que era realmente o projeto de transposição. E, ao querer escrever sobre água, esse fato se faz presente, porque Frei Luiz Cappio nos mostrou que a água merece respeito e atenção, ela é digna de nosso esforço na luta em sua defesa. E quando defendemos a água, defendemos todas as formas de vida, porque tudo precisa da água para viver. Defender a água é um gesto de louvor ao Criador.

Precisamos olhar para a água, admirar mais a sua beleza, se encantar mais por ela, procurar saber um pouco mais de seu mistério e reconhecer o quanto ela é importante. Também é preciso dizer não à degradação, ao desperdício e à poluição que a água vem sofrendo. É preciso dizer, com veemência, um sonoro não ao projeto de transformar a água em simples mercadoria. Porque ela é um dom de Deus, um precioso bem comum. E somos desafiados a garantir água, dignidade e paz para todos, em todas as partes do mundo, hoje e no futuro.
Começamos nossa reflexão num ponto de conflito, que é a “Crise da Água”. Mas não se pode ficar parado nisso, é preciso percorrer um caminho de esperança, como um rio que avança, superando desafios e buscando possibilidades para chegar ao mar. Falamos da crise, da escassez, do desperdício, da degradação e da privatização, o perigo de se transformar a água, que é dom de Deus, em simples mercadoria. Percorrendo esse caminho difícil, concluímos que a água é um direito sagrado e de todos. A água é uma questão de paz, é um bem para a humanidade, é garantia de vida e dignidade para todas as criaturas.

2. Surge a “Crise da Água”
Todos os anos, em 22 de março, é celebrado o Dia Mundial da Água. E em 2002, a data foi marcada por um anúncio assustador e preocupante para toda a humanidade. A Organização das Nações Unidas (ONU) anunciou que “mais de 2,7 bilhões de pessoas deverão sofrer com a falta de água em 2025, caso o consumo do planeta continue aos mesmos níveis”. E de lá para cá, não se tem informações concretas sobre se houve ou não uma mudança substancial na forma de se usar a água. É certo que muita gente passou a ter maior cuidado com as águas e governos e instituições tomaram medidas com relação ao problema. E depois de cinco anos, o anúncio feito pela ONU ainda faz forte eco e nos convida a refletir e a tomar uma atitude. A ONU alertou também que mais de 2,5 bilhões de pessoas estarão vivendo em áreas onde a quantidade de água potável será insuficiente para suprir suas necessidades. Isso devido à má administração dos recursos hídricos, ao crescimento populacional e às mudanças climáticas por que passa o planeta. As áreas sob maior risco de enfrentar a falta de água estão nas regiões semi-áridas da Ásia e de parte da África ao sul do deserto do Saara. Segundo as estatísticas da ONU, na Europa, pelo menos 120 milhões de pessoas que vivem no continente – um em cada sete habitantes – hoje não têm acesso à água potável e saneamento. E de acordo com o mesmo estudo, o continente europeu gasta cerca de US$ 10 bilhões por ano devido ao desperdício de água. (1)

Conforme relatório da Agência Internacional de Energia Nuclear (IAEA), nas próximas duas décadas, 1,1 bilhão de pessoas no mundo não terão acesso à água potável, cerca de 2,5 bilhões carecerão de saneamento básico e mais de 5 milhões morrerão de doenças causadas por água contaminada a cada ano. Menos de 3% da água na Terra é potável, sendo que a maior parte disso está na forma de gelo polar ou se encontra em camadas profundas e inacessíveis do planeta. E a quantidade de água potável que está acessível – seja em lagos, rios ou represas – representa menos de 0,25% do total. Ainda que a água necessária para o consumo das populações do mundo fosse suficiente, ela estaria ameaçada pela contaminação e pela grande demanda (2). Estas e outras informações, um tanto quanto assustadoras, foram colocadas a público no ano de 2002 e, a partir daí, foram se multiplicando as discussões sobre o assunto.
Na quaresma de 2004, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), lançou a Campanha da Fraternidade com o tema: “Fraternidade e Água” (3) e com isso o assunto flutuou em todo o país. A campanha da Igreja fez com que, não apenas os católicos, mas toda a sociedade discutisse a questão da água e, então, veio uma enxurrada de informações a respeito da “crise da água” no planeta. O anúncio da ONU que comentamos acima, com a Campanha da Fraternidade, ganhou mais força e ecoou por toda parte. A crise foi anunciada e também celebrada, foi evidenciada como um chamado à conversão. Mas também muitas questões foram se esclarecendo e nos damos conta de que o discurso da escassez da água deve ser melhor analisado.

Frei Pilato Pereira, OFM
Quer saber mais acesse a página www.franciscanos.org.br/ecologia/agua/artigos2008/14.php
e continue lendo os artigos.
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(1) BBC Brasil http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/020322_secaml.shtml - 22 de março, 2002 - Publicado às 20h59 GMT
(2) BBC Brasil http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/020322_secaml.shtml - 22 de março, 2002 - Publicado às 20h59 GMT
(3) Todos os anos durante o tempo da Quaresma a Igreja Católica realiza no Brasil uma campanha que aborda um tema social, a chamada Campanha da Fraternidade.

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